As Figuras de Transição, nada têm
a ver com salvadores da pátria, rebeldes sem causa, iconoclastas, marqueteiros
e mitômanos. Embora esses tipos possam tentar se passar por Figuras de
Transição – e, às vezes, até consigam iludir algumas pessoas por algum tempo -,
o fato é que elas são tão diferentes quanto à água e o vinho. E o principal motivo disso é que uma Figura
de Transição está sempre preocupada em não descansar sobre os louros da
vitória, não se embriagar com seu próprio poder e autoridade e não se esquecer
de quem ela é e de onde veio. Ela não faz isso porque possui algum tipo de
poder sobre-humano. Na verdade, é o oposto. Por ter consciência de que é apenas
humana, está sempre atenta às suas ações e reações diante das pressões
cotidianas, e não hesita em reconhecer seus erros e corrigir a rota toda vez
que for necessário.
No livro Siga sua vocação que o dinheiro vem, a educadora e psicóloga Marsha Sinetar usa uma metáfora muito
interessante para falar desse mecanismo interno de “correção de rota”. Ela nos
convida a “abraçarmos nosso eu interior”, incorporando, em nós mesmos, os três
personagens centrais da parábola do Filho Pródigo. Para quem não se lembra,
essa parábola conta a história de um homem que tinha dois filhos. Um deles decidiu
pegara a parte da herança que lhe cabia a sair pelo mundo. O outro resolveu
ficar e ajudar o pai. O filho que deixou o lar levou, por algum tempo, uma vida
de prazeres e dissipação, até que gastou tudo e começou a passar dificuldades. Por
fim, retornou à casa paterna e foi recebido com festa pelo pai. Sua recepção
calorosa provou a indignação do irmão, merecedora de tal recepção. O pai tratou
de tranquilizar o filho, assegurando-lhe que um dia ele herdaria todos os seus
bens, mas explicou-lhe que seu coração de pai estava feliz porque o outro filho
havia reconhecido os erros retornados. Segundo Marsha, somos o filho pródigo
toda vez que erramos e reconhecemos o erro. Somos o irmão indignado quando não
nos permitimos ignorar as consequências de nossos erros. E somos o pai
compreensivo quando damos a nós mesmos uma segunda chance. Ampliando ainda mais
o alcance dessa bonita metáfora, gostaria de acrescentar que devemos ser os
três personagens da parábola nas devidas proporções. Se o filho pródigo
predominar, corremos o risco de cair em autopiedade estéril. Se o irmão for a figura principal, podemos nos
tornar excessivamente críticos em relação a nós mesmos, punindo-nos
constantemente e nunca chegando a lugar algum. Se o pai prevalecer, existe o
perigo de nos tornarmos complacentes demais, a ponto de não enxergar nossas
próprias falhas. Por outro lado, quando os três personagens estão em equilíbrio,
conseguimos rever nossa conduta e conceder-nos o direito de recomeçar.
É exatamente esse mecanismo
equilibrado que falta às falsas Figuras de Transição. Ou são complacentes
demais com elas mesmas, ou são criticas demais para com os outros ou, o que é
mais comum, são ambas as coisas ao mesmo tempo. Contudo, ninguém disse que esse
desequilíbrio não pode ser corrigido. Existem muitas pessoas que, no
passado, movidas pela imaturidade e pela
falta de orientação adequada, acabaram desenvolvendo características de falsas
Figuras de Transição, mas o tempo e a experiência lhe mostraram a necessidade
de mudar. Ao enfrentarem o desafio de mudar, deram o primeiro passo no caminho
para se tornar verdadeiras Figuras de Transição.
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